Pesquisar este blog

terça-feira, 18 de dezembro de 2018

Praça do Comércio

Figura 1 1856. Praça do Comércio com Rua Direita. 
 Fonte: P. G. Bertichem, Lithographia Imperial de Eduardo Rensburg, Rio de Janeiro.


Olho o velho edifício amarelado ao final da Avenida Presidente Vargas e lembro que ali, freguesia da Candelária no período colonial brasileiro, está uma obra do arquiteto Grandjean de Montigny (1776-1850), integrante da Missão Artística convocada por D. João: o edifício da Real Junta de Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação, na antiga Praça de Comércio. Segundo descrição da época, a arquitetura mostrava: na parte superior as armas dos três reinos, em baixo-relevo, sustentadas por dragões, e nos quatro ângulos figuras sentadas representando as quatro partes do mundo. No interior, um salão em forma de cruz, cercado de colunas da ordem dóricas, formavam uma galeria em roda. O teto arqueado, parecendo abóbada, possuía, no centro, uma claraboia. Nos arcos que a sustentavam, o dístico J. VI e as armas do Reino Unido a Portugal e Algarves deixavam à vista os ornatos e colunas. Ao lado do mar, uma escada, que um dia chegou ao antigo cais. O edifício esteve encravado entre os armazéns da alfândega e, provavelmente, ali se sentia os cheiros que envolviam o cais: o do fumo guardado, o cheiro das sacas de café, do suor de trabalhadores livres e dos escravos que chegavam aos montes, vivos ou mortos. Era uma bela construção e pelos desenhos de Grandjean de Montgny, do acervo do Museu Nacional de Belas Artes,  se percebe um vestíbulo ornado com grades em fer forgè , três portas de verga curva na frontaria e 24 colunas dóricas. Também o desenho  mostra uma claraboia central onde se permite contemplar o céu.
A Praça do Comércio, onde estava o prédio da Real Junta de Comércio, reunia os negociantes do período colonial. Era ali, junto aos trapiches de armazenamento das mercadorias que saiam para exportação e entravam, pela importação, que se juntavam mercadorias e escravos – tratados por peças, como se mercadoria fossem –  em um amarfanhado de gente rica, impecavelmente vestida, os negociantes e compradores; os escravos da estiva na labuta e os escravos recém-chegados que se misturavam junto ao mar. Ali circulava o dinheiro que transformava traficantes de escravos em nobres ou em respeitados senhores com lícitas atividades. 
A Praça do Comércio da Corte, desde D. João, que a visitava sempre e ali era aclamado pela abertura dos portos, tinha grande influência sobre as atividades na Corte. Dali saía o dinheiro para remodelar a cidade e tornar lícitas, a partir de 1831, as atividades ilícitas dos homens que traficavam vidas. Em 1821, uma revolta popular dali partiu, reivindicando do rei, que se preparava para retornar a Lisboa, uma constituição liberal. A sangrenta revolta levou ao fechamento da “Praça” até 1824, quando foi transformada em Alfândega e o prédio foi modificado por questões de segurança.
Lembranças da história do Rio que poucos conhecem!

Para saber mais:

ALBUQUERQUE, Aline Emanuelle De Biase.  De “Angelo dos retalhos” a Visconde de Loures: a trajetória de um traficante de escravos (1818-1858) . Dissertação (Mestrado em História) Universidade Federal de Pernambuco, 2016.

ANDRADE, Leandro Braga de. Negociantes regionais e mercado interno: uma análise da praça comercial de Ouro Preto, Minas Gerais, no século XIX. Anais. XV Encontro Regional da ANPUH-Rio. Rio de Janeiro: ANPUH, UNIRIO, 2010

FRAGOSO, João Luis Ribeiro. Homens de Grossa Aventura: acumulação e hierarquia na praça mercantil do Rio de Janeiro (1790-1830). Rio de Janeiro: Arquivo Nacional. 1992.

FUNDAÇÃO CALOUSTE GOULBEKIAN. Patrimônio de Influência Portuguesa. PESSÔA, José Simões Belmont.  Praça do Comércio do Rio de Janeiro. Disponível em http://www.hpip.org/def/pt/Homepage/Obra?a=861 Acesso 10/12/2018