Será
que todos aqueles que passam peça ponte Rio-Niterói e veem a Ilha com um
castelo no meio da Baía sabem que ali fica a Ilha Fiscal? Essa ilha foi
importante? Por que?
A
ilhota, de cerca de 7.000 metros quadrados, antes conhecida por Ilha dos Ratos[1],
teve alterado o nome para Fiscal, a partir do século XIX, com a construção do
palacete para instalação da Alfândega, por ordem de D. Pedro II. Essa
ponderação da necessidade de criar uma aduana foi levada ao Imperador pelo
Conselheiro José Antônio Saraiva, do Ministério da Fazenda, que solicitou um
posto alfandegário para o controle das mercadorias a serem importadas e
exportadas pelo porto do Rio de Janeiro. A posição da ilha dos Ratos era muito
boa para abrigar a Alfândega, face à proximidade dos pontos de fundeio das
embarcações e do porto.
D.
Pedro II, entusiasmado pela beleza do lugar e pelos golfinhos, constantes
visitantes marítimos da ilhota, decidiu mandar fazer ali uma construção, inspirada
em castelos medievais franceses[2],
que se destacasse na baía. Às vésperas da república, em 1889, o palacete foi
inaugurado ao público[3] com
um baile realizado a 9 de novembro, oferecido, pelo Imperador, aos
comandantes e oficiais, do encouraçado chileno ali ancorado, como forma de agradecer
a hospitalidade aos navios brasileiros no Chile. A construção do palacete da
Alfândega foi entregue, pelo governo imperial, ao engenheiro Adolpho del
Vecchio, que com a mão-de-obra de portugueses e muitos escravos, levou quase
oito anos para finalizá-lo.
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Engenheiro Adolpho del Vecchio |
O
castelo, com um torreão, foi projetado com um relógio de quatro faces comprado
à firma alemã Krussmann, com corda acionada duas vezes por semana. O relógio possuía
iluminação interna de modo a ser visível até à noite àqueles que chegavam ao
porto e a quem morava nas proximidades, em terra. Para proteção e segurança do
prédio durante os temporais, foi instalado, no ápice do torreão, um sistema de para-raios.
O
baile, o último da Monarquia, a seis dias de instauração da República, foi
planejado para o recebimento de dois mil convidados na ilha, ainda que tenha
recebido cerca de cinco mil, usou para o evento a parte externa e interna da
edificação. Os convivas, recebidos por D. Pedro II, D. Teresa Cristina,
Princesa Isabel e o Conde D’Eu, chegaram à ilha em embarcações pequenas,
ornamentadas com bandeirolas do Brasil e do Chile e pequenas lanternas de
estilo veneziano. Duas mesas, em forma de U serviram o jantar para 500
convidados especiais, que comeram Creme à la Richelieu, Purée à la Reine,
Charteuse de Perdrix à la Prairie, Langue écarlate gelée à l’Anglaise,
Grand Pudding à la Diplomate e Creme au chocolat e aux violettes, entre outras
iguarias, 12 mil sorvetes e 500 pratos de doces diversos. Para tal banquete
foram consumidos 18 pavões, 18 perús, 300 galinhas e 350 frangos, 100 línguas
de vaca, 800 quilos de camarão, mil peças de caça, 1200 latas de espargos,
800 latas de trufaz. Beberam os convidados do baile cerca de 12 mil garrafas
de vinho e 10 mil litros de cerveja, segundo a pesquisadora Maria Antônia Goés[6].
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A Revoltada Armada (1893). Óleo sobre tela de A. A. Santos Acervo Instituto Cultural Sérgio Fadel |
Em
1997 a ilha foi transformada em museu, aberto ao público. A Marinha brasileira
oferece visitas à ilha, através do Espaço Cultural da Marinha, localizado ao
lado das barcas, na Praça XV. O passeio pode ser feito por escuna, ou ônibus,
de acordo com as disponibilidades, com guia.
[1] É desconhecido pela
historiografia o porquê do nome. Seria pelos inúmeros ratos vindos da Ilha das
Cobras? Ou pela cor cinza das pedras da
ilha que, ao longe, pareciam ratos?
[2] A obra arquitetônica foi projetada em estilo gótico-provençal,
inspirado nas concepções do arquiteto francês Eugène Emannuel Viollet-le-Duc
(1814-1879), ligado à fase da arquitetura que pretendia reviver os séculos
anteriores.
[3] Em abril de 1889, o
Imperador, acompanhado do Conde D’Eu e do Visconde de Ouro Preto, receberam a
obra do engenheiro del Vechio.
[4]
O morro do Pasmado, em Botafogo, foi objeto das remoções empreendias nas
décadas de 1960/70 e hoje só tem um mirante que se abre para o túnel do mesmo
nome, construído em 1947 e terminado em 1952, com 220 metros de extensão em uma
só galeria, que liga os bairros de Botafogo e Copacabana.
[5]
Foram usadas pela firma Moreira & Carvalho, utilizando a técnica de
marchetaria, as seguintes madeiras brasileiras: amendoim, pau-brasil,
pau-cetim, peroba-do-campo, tremida, raiz de imbuia e roxinho; jacarandás da
Bahia, do Rio de Janeiro, do Espírito Santo e de Minas Gerais; canela, imbuia,
garapa, pau-marfim, peroba-do-campo e sucupira.
[6] Brasil na Hora de
Temperar. Sintra, Portugal: Colares Editora, 2008.