Duas representações: o jongo em barro. |
O Jongo chegou
ao Brasil através dos negros bantu, trazidos como escrevos para a região do
Vale do Paraíba, para as plantações de café. Os bantu eram originários da
região do Congo e de Angola.
Para acalmar
as revoltas dos negros os donos de escravos permitiam que, em dias de santos
católicos, se dançasse o jongo. O jongo embora parecesse um divertimento
profano, tinha uma atitude religiosa que envolvia a festividade. Os “pontos” do
jongo, por exemplo, de sentido metafórico, cifrado, precisavam ser compreendidos.
O Jongo com
seus “pontos” metafóricos são uma tradição oral negra que se perpetuou. Através
dos “pontos” era comum que se combinassem fugas o que era feito às claras,
porém sem o entendimento do branco. Também era no jongo que os jongueiros se
desafiavam porque demonstravam ali sua sabedoria ao “desatar o ponto”, isto é,
decifrá-lo para os demais.
Segundo a ONG
Jongo da Serrinha, “o jongo é uma dança ancestral, sos pretos-velhos escravos,
do povo do cativeiro, por isso pertence a linha das almas”. Faz parte da crença
aceitar que um antigo jongueiro morto se aproxime da roda para lembrar o tempo
em que dançava. Também se acredita que antigos jongueiros plantavam, no meio da
roda, um pé de bananeira que à meia-noite dava frutos que eram servidos aos
presentes. A tradição do jongo persiste e, no Rio de Janeiro, o jongo foi dos
primeiros ritmos a surgir no alto das favelas e nas casas, “quintais”, dos primeiros sambistas.
O pesquisador
Dias (2001) explica que as festas negras, no Brasil, têm duas matizes: as
internas,
no terreiro, a celebração intra-comunitária, recôndita, noturna, onde
se reforçam, sem grande interferência ou participação do branco, os valores de
pertencimento a uma matriz cultural e religiosa africana; na rua, a festa
extra-comunitária, em que o negro, através das danças de cortejo, busca
inserir-se nas festividades dos brancos e ganhar certa visibilidade social,
mediante a adoção de valores religiosos e morais da classe dominante.
Explica o
autor, ainda, que o jongo é uma dança de roda,
em alguns casos com par solista ao centro. Seus instrumentos são o
tambú (tambor maior) e o candongueiro (tambor menor) e a inguaia (chocalho de
cesto). Os pontos ou melodias do jongo falam do cotidiano da comunidade (visaria)
ou propoem desafios, através de enigmas a serem decifrados (demanda ou goromenta).
A linguagem é sempre metafórica. O estilo do canto é responsorial (alternando
solo-coro). [...] Entre os grupos afro-descendentes do Sudeste, como os que
praticam o Jongo e o Candomblé, um índice da importância que assumem os tambores
tradicionais é a utilização do termo ingoma (do banto ngoma, tambor) para se
referir tanto aos instrumentos quanto ao evento musical e coreográfico que
estes acompanham ou ao próprio grupo ou comunidade dos dançantes, extensão semântica, aliás,
corrente entre as culturas da Africa banto. Os herdeiros dessas tradições
consideram-se, pois, “comunidades do tambor”.
Ele registrou, durante sua pesquisa, a dança do jongo em Guaratinguetá,
Taubaté, São Luís do Paraitinga, Lagoinha, Cunha e Piquete, todas no Vale do
Paraíba paulista, e em várias cidades do Rio de Janeiro.
São exemplos de pontos, citados pela
ONG Jongo da Serrinha:
PISEI NA PEDRA
(ponto de louvação, Darcy Monteiro)
Pisei na
pedra, a pedra balanceou,
levanta meu
povo, cativeiro se acabou.
EU CHOREI
(ponto de visaria, Manuel Bam-Bam-Bam)
Eu chorei, eu
chorava,
era minha mãe
que me acalentava.
Bem
pequenininho, mamãe me embalava,
por isso que
eu chorei, por isso que eu chorava.
Ia para a rua,
na rua eu brigava,
era minha mãe
que me consolava.
Meu pai me
batia, ai, como apanhava,
era minha mãe
quem desapartava.
E a professora
quando me reprovava,
era minha mãe
quem me incentivava.
VAPOR DA
PARAÍBA (Vovó Teresa)
Vapor berrou
na Paraíba,
chora eu,
chora eu Vovó.
Fumaça dele na
Madureira,
e chora eu.
O vapor berrou
piuí, piuí.
Ô irê, irê,
irê,
ô irê, irê,
irê.
Vovó Teresa conta nesse jongo a sua ida de
trem de Paraíba do Sul para o subúrbio de Madureira. Vendo a fumaça do trem de
ferro Maria-Fumaça, lembrava das chaminés dos navios do Rio Paraíba.
13 DE MAIO
(ponto de louvação, Djanira do Jongo)
No dia 13 de
maio,
cativeiro
acabou,
e os escravos
gritavam
liberdade
senhor.
Hoje,
26 de julho é comemorado o dia do jongo e resolvi trazer para o blog esta
importantíssima contribuição dos negros para a cultura do Rio de Janeiro.
Fonte:
DIAS, Paulo. A outra festa negra.
In: KANTOR, Iris e JANCSÓ, István (org.). Festa: Cultura e Sociabilidade na
América Portuguesa, FFLCH/USP. São Paulo: Hucitec/ Edusp, 2001.
Jongo da Serrinha. Disponível em http://www.jongodaserrinha.org.br/v2/index.htm
Acesso em 26/07/2012
Para saber mais:
ANDRADE, Mário de. Aspectos da
Música Brasileira. Belo Horizonte, Vila Rica, 1991.
ARAUJO, Alceu Maynard.Folclore
Nacional Volume II. São Paulo, Melhoramentos,
1964.
BASTIDE, Roger. Sociologia do
Folclore Brasileiro. São Paulo, Anhembi, 1959.
________________Las Américas
Negras.. Madrid, Alianza Editorial, 1969.
________________As Religiões
Africanas no Brasil. São Paulo, Pioneira, 1989.
RIBEIRO, Maria de Lourdes Borges.
O Jongo. Rio de Janeiro, FUNARTE, 1984
Nenhum comentário:
Postar um comentário