Escola Normal de 1888 a 1914 Fonte:AGCRJ |
um primeiro passo sem o qual não póde o homem melhorar
ou progredir [ porque] não há civilização sem sucessivas conquistas da
intelligencia; esta só com a cultura se desenvolve: essa cultura é a
instrucção, de que a primaria é o fundamento (Relatório do Ministério dos
Negócios do Império de 1871, apresentado em maio de 1872, p.18)
Desde o Império a instrução primária foi tratada como de importância como
instrumento civilizatório do povo brasileiro e da unidade do território. Era
importante forjar o sentimento nacional, a brasilidade, o sentido de nação.
Construir uma nação que pudesse inserir-se no mundo exigia, dentre outras
ações concretas e pragmáticas, manter e conservar o território, educar o povo,
dar-lhe civilidade, mas também espargir sobre todo o país uma cultura que o
representasse, um sentimento de nação e uma língua nacional que ligasse os mais
distantes recantos dando-lhes unidade. Era esta a tarefa gigantesca do sistema
republicano.
Após a Independência do Brasil, o Império brasileiro já havia buscado,
como meta, a preservação do território nacional. Deste modo utilizou recursos
humanos e financeiros altos, despendidos em lutas e tratados. Para isso,
também, tentou fazer chegar ao povo, através da educação escolar, os ares da
civilização que, em bases europeias, serviriam como modelo para a empreitada
que se levava a cabo.
A civilidade deveria começar,
imaginavam, em redutos específicos, feitos para este fim, que objetivassem
instruir, a partir da criança, os pais. Debates foram travados entre os que
podiam opinar e aqueles que atuavam efetivamente nas Assembleias Provinciais, e
depois nas Câmaras, sobre o melhor método para chegar aos objetivos a que se
propunham. Esforços diferenciados foram realizados em iniciativas governamentais e particulares,
em diferentes pontos do solo brasileiro.
A substituição progressiva do
regime preceptoral pelas casas-escola mostrou os primeiros passos desse
caminhar. Depois, a construção de escolas públicas. Por óbvio o tamanho do
território nacional e a diversidade de sua população fizeram com que estas
iniciativas coexistissem muitas vezes, ao lado de outras, numa complexa e
intrincada teia. No entanto, pode-se afirmar que a formação deste Estado
nacional a partir da instrução do povo se fez presente, em espaços temporais
diferenciados, em todo o país.
Quando o regime republicano se
instaurou muitos projetos, de maior ou menor envergadura, foram pensados e
implementados. Construir uma nação não tinha, e não tem, fórmulas e
ensinamentos. Por isso, no primeiro momento, nos primeiros anos, se observam
marchas e contramarchas rumo ao ideário tão acalantado, especialmente discutido
pós- abolição da escravatura. A república dos sonhos muitas vezes não se fazia
no cotidiano.
A oligarquia deposta com D. Pedro II não fora no mesmo navio rumo à
Europa. Ela mandava ainda. A economia agro-exportadora mudara a mão-de-obra, de
escravos para imigrantes, mas continuava desfrutando de parcelas, por vezes
grandes, do poder político.Por outro lado ela aumentava, se distribuía, novos
espaços serviam às plantações de café além do vale do Paraíba, o que dividia a
elite. Por conta dessa luta por fatias do poder, de não haver como transformar
sonhos em realidade palpável, a República, em seus primeiros momentos é confusa
e desorganizada até.
Como tornar o povo civilizado? Às
escolas, representações da estrutura social no espaço educacional, cabiam,
ainda, a tarefa de, pela instrução, trazer a civilidade. Aos professores,
executores do processo escolar, competia o esforço patriótico de serem os construtores da nação.
Mas todo esse processo seria talvez
mais simples se o país tivesse professores. Quem eram aqueles que ministravam
aulas?
Construtores da nação
As
professoras primárias eram definidas como as verdadeiras construtoras da nação,
e a profissional modelo era aquela formada nas escolas normais, cuja prática de
ensino estava voltada para o bem dos alunos e do país.Essa idéia, que tinha
raízes nas exigências de conduta ilibada e dedicada datavam do Império, ganhou
força no início da República e, embora tenha sofrido muitos golpes com o passar
do tempo e com a desvalorização da profissão docente, não foi inteiramente
afastada do imaginário social do país. (Gomes, 2002, p . 405)
Primitivo Moacyr (1937)
explicou que os professores eram, no Império, homens probos, que se dedicavam
ao magistério. As mulheres, poucas, eram de modo geral estrangeiras e atuavam
no âmbito das residências de seus alunos. Inspirados na Ècole Normal francesa, foi criada a Escola Normal para habilitar os
professores em atividade e aqueles que desejassem ingressar neste quadro. O
governo imperial repassou às províncias, pelo Ato Adicional de 1834, a criação
e manutenção das Escolas Normais. A primeira Escola Normal aparece em 1835, na
província do Rio de Janeiro. Logo muitas mais se proliferaram e se extinguiram
da mesma forma. As províncias não tinham como fazer funcionar, administrar e
manter estas escolas. Por outro lado o currículo por elas oferecido se
assemelhava, e muito, com o aquele que as escolas secundárias ofereciam e que
tinham seu modelo, nem sempre atingido, no Imperial Colégio de Pedro II. Por
vezes uma única disciplina, Pedagogias, as diferenciava.
O
governo Imperial instituiu uma Escola Normal para rapazes e moças, em 1876, na
Corte. O empreendimento era vultuoso. Esta Escola também não durou muito, não
havia verbas para mantê-la.[1] Os
gastos com a Guerra do Paraguai, recém terminada, exauriram os cofres públicos.
Em 1880 o Governo Imperial criou uma
Escola Normal para professores primários, na Corte, com a verba existente da
cessão dos ferro carril na cidade do Rio de Janeiro, chamando-a de Escola
Normal da Corte. O diferencial desta Escola foi, naquele momento, o engajamento
de seu corpo de professores, através da sua Congregação, ao esforço nacional de
formar os construtores da nova nação que se estava criando.
Escola Normal de 1880 a 1888. Funcionava na Escola Politécnica. |
A Escola Normal da Capital Federal,
sucedânea da anterior, incorporou através da sua Congregação de professores
esta missão de tal forma que, apesar das alterações políticas contextuais que
vão existindo neste percurso, criou tensões e embates, pelo que considerava
possivelmente desvios da meta a ser atingida.
A necessidade de construir uma ação
civilizada tem sido tratada pela historiografia (GONDRA, 2008; NEVES, 2003;
GOMES, 2002; OLIVEIRA, 1990 e outros) como projeto central dos regimes imperial
e republicano, ainda que o desdobramento dessa política, na prática,
possibilite que possamos diferenciar suas estratégias, por isso, o sentimento
patriótico de pertencimento esteve sempre, não importa em qualquer destas
épocas, no âmago da questão a ser tratada. O sentimento patriótico tinha de ser
disseminado, e mais que isso apreendido, de tal forma que se constituísse um
povo e este, por conseqüência, uma nação.
A ideia de nação faz parte do universo
simbólico. Sua valorização visa proporcionar sentimentos de identidade e de
alteridade a uma população que vive ou que se originou em um mesmo território.
Trata-se de um símbolo que pretende organizar o espaço público, referindo-se, portanto,
à dimensão política. (Oliveira, 1990,p.14)
A escola primária, enquanto espaço sistemático de ensino, era o local
mais apropriado para transmitir à nova geração de brasileiros o sentido da
política que se desenvolvia e, mais, que se pretendia tornar real. A família,
centro até então do único processo educativo, ainda que por vezes desenvolvido
por preceptores, não tinha como transmitir os novos valores, as novas
tendências, o modelo a ser seguido.
Os debates sobre a educação,
obrigatória desde a Constituição de 1824, foram amplos e refletiam a
diversidade de propostas a serem postas em prática o que não alavancava os
procedimentos a serem tomados, mas colocava em evidência uma necessidade
nacional.
Na República, com este processo já
tendo sido iniciado, urgia levar avante o projeto, o que só poderia ser feito,
acreditava-se, com a criação das Escolas Normais de modo a formar quem teria
como profissão educar e instruir o povo civilizado. Assim, estas escolas
passaram a funcionar legitimadas pelo poder vigente pela necessidade de
construir a nação, através do trabalho de seus professores .
[1] Ver,
para maiores informações sobre a Escola Normal de 1876 o Relatório da
Instrucção Publica de 1880, anexo E, p.18-20
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